Cuma inicia parceria com grupo de pesquisa Narramazônia

Enviado por Anônimo (não verificado) em Qui, 23/06/2016 - 11:52
"Às vezes, os mitos não estão escritos, mas eles têm outras formas”. É o que afirma a coordenadora do núcleo de pesquisa Culturas e Memórias Amazônicas (Cuma) da Universidade do Estado do Pará (Uepa), Josebel Akel Fares. A declaração ocorreu na tarde da última quarta, 22, durante evento promovido pelo grupo de pesquisa Narrativas Contemporâneas na Amazônia Paraense (Narramazônia) e também marca o início de uma parceria entre os grupos, com o objetivo de refletir sobre saberes regionais, narrativas míticas, literárias e midiáticas sobre e da região.
 
Durante a mesa Narrativas míticas: a Amazônia entre matintas, curupiras e linguagens corporais, foram discutidas as relações entre os mitos amazônicos, imaginário das sociedades indígenas e a representação desse pensamento mítico para nós. O pesquisador da Universidade da Amazônia (Unama), Walmir Nogueira, apresentou uma síntese de suas pesquisas sobre o mito do curupira entre os índios da etnia Tembé. A pesquisadora também da Unama, Reliane Pinho, apresentou a relação entre o mito do encontro com a Ajykwasara e os trançados utilizados nos artefatos dos Asurini do Xingu.
 
A coordenadora do Cuma, Josebel Akel Fares, comentou sobre a pesquisa apresentada no livro Um memorial das matintas amazônicas, recém-lançado pela Fundação Cultural do Pará (FCP) e recebedor do Prêmio Vicente Salles, em 2014. Esse livro é a pesquisa de dissertação da autora, defendida em 1997. De lá para cá, a produção havia permanecido oculta do grande público, até que, com o incentivo do filho, a autora inscreveu-a no prêmio.
 
A obra trata das narrativas sobre as matintas pereras, personagens marcantes no imaginário e na vida de muitas pessoas da região amazônica. A pesquisa foi feita a partir das narrativas recolhidas em Bragança, na Região do Rio de Caeté, pela pesquisadora e pelo projeto Imaginário nas Formas Narrativas Orais Populares da Amazônia da Universidade Federal do Pará (Ifnopap/UFPA). “Esse mito, que ora se configura como aéreo, ora como terreno, ora como invisível, toma os contornos da imaginação de quem conta, ouve ou vê, todavia, no momento epifânico guarda similaridades: a matinta é uma aparição noturna, que marca presença por meio de um assobio desassossegador ou desafiador”, escreve Josebel Fares no prólogo da obra.
 
Compreender as narrativas na Amazônia é pensar nelas como formadoras da subjetividade das nossas sociedades, formas de conceber e conhecer o mundo, de organizar a realidade, de estabelecer relações com as muitas cotidianidades da vida. Segundo a coordenadora do Cuma, “nós nos constituímos por essas narrativas. Nós somos Amazônia por conta do mito das amazonas. Nós somos narrativas porque a narrativa permeia o nosso imaginário, permeia o nosso dia-a-dia. Então, é importante as estudarmos, especialmente os mitos, que constituem um dos grandes vieses do entendimento da Amazônia. Quem não entende do mito, nunca vai entender a Amazônia”.
 
 
A PARCERIA
 
O Narramazônia é um grupo interinstitucional e transdisciplinar, coordenado pela docente do Programa de Pós-Graduação Comunicação, Cultura e Amazônia (PPGCom/UFPA), Alda Cristina Costa, e pelos docentes do Programa de Pós-Graduação em Comunicação, Linguagens e Cultura (PPGCLC/Unama), Vânia Maria Torres e Paulo Martins Nunes. O grupo foi criado em 2015 e conta com a participação regular de pesquisadores de outras instituições.
 
De acordo com Alda Cristina Costa, a parceria é uma oportunidade ampla de potencializar a produção do conhecimento e o pensamento sobre a imensidão do universo amazônico. “A Amazônia tem uma rica história, um rico imaginário, uma rica cultura. As narrativas nos possibilitam transmitir toda essa cultura. Elas são uma ligação, uma relação comunicativa, cultural e simbólica com a própria sociedade. Quando pensamos na transdisciplinaridade, entendemos que a narrativa não pertence somente à Literatura, mas também à Antropologia, à Sociologia e à Comunicação. O envolvimento de todas essas áreas permite o enriquecimento ainda maior das nossas discussões”, afirma a cientista social e comunicóloga.
 
Para a professora Josebel Fares, o engajamento do Cuma nessa parceria não é só uma relação administrativa, mas uma maneira de integrar os pesquisadores da região, que têm objetos de pesquisa similares e estão orientados a refletir sobre a Amazônia. “Os laços interinstitucionais só acontecem quando eles estão para além disso. Quando trabalhamos só com institucional, não se anda. Aqui nós temos pesquisadores que trabalham junto conosco, sobre as mesmas matérias, e isso vai nos aproximar. No Cuma, trabalhamos com a mesma temática que o Narramazônia. Acho que é muito promissor o que temos pela frente”, declara.
 
Isso representa mais um passo rumo à consolidação do Cuma, criado em 2003, quando Josebel Fares retornou do doutorado na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). Com mais de 10 anos, o núcleo já possui uma extensa lista de produções, relevantes tanto para a academia quanto para outros setores. Além das publicações, o Cuma tem o periódico Sentidos da Cultura, realiza reuniões mensalmente para discutir cultura, arte, história e memória, além de ter professores vinculados à Licenciatura Intercultural Indígena.
 
Texto e Foto: Sergio Ferreira Junior
Ilustração: Narramazônia