Curso livre de mandarim abre as portas do Oriente ao Pará

Enviado por Ize Sena em Ter, 21/06/2016 - 15:23
A Universidade do Estado do Pará (Uepa) deu largada nesta semana às aulas para 60 alunos das três primeiras turmas do curso livre de mandarim, a língua oficial falada na China. As aulas, ministradas pelo Instituto Confúcio, em parceria entre a Uepa e a Universidade de Shandong, são resultado de quatro anos de aproximação comercial e cultural entre o governo chinês e o Pará. 
 
Nesta terça-feira (21), o reitor da Uepa, Juarez Quaresma, e o vice-reitor, Rubens Cardoso, deram as boas vindas à turma extra, formada exclusivamente por estudantes da Uepa. Vinte jovens, na faixa etária de 18 a 23 anos agora se dedicam ao aprendizado do novo idioma. “Formação de profissionais qualificados e que possam contribuir para o desenvolvimento do nosso estado. Esse é o papel da Uepa e vocês são privilegiados por estarem aqui. Então, aproveitem e se empenhem porque não é fácil aprender outra língua. Alguns de vocês já devem ser formados em outros idiomas, mas agora são outras regras e dinâmicas que envolvem uma língua viva”, pontou o reitor aos novos alunos.
 
As vagas para o curso livre de mandarim foram abertas pela Uepa entre 13 a 17 de junho. A previsão inicial era uma oferta de 40 vagas em duas turmas, mas a procura foi tão grande que uma turma extra foi aberta. “As inscrições foram preenchidas em 15 minutos. Sobraram mais de 245 interessados inscritos. Criamos uma lista de espera com pré-matrículas para as próximas turmas”, informa o coordenador do curso e diretor brasileiro do Instituto Confúcio no Pará, Antônio Carlos Braga.
 
As aulas correspondem ao módulo básico do curso, formado por três níveis de estudos – um a cada semestre. Após esse primeiro ciclo de conteúdos, os participantes estarão aptos a fazer provas de proficiência e também a concorrer a bolsas de estudos e intercâmbio cultural, inclusive com viagens à China, oferecidos pelo Instituto Confúcio e Universidade de Shandong. “Neste início de curso se oferece contato com a cultura e a língua. Depois desse ciclo básico, vêm os módulos para estudo da escrita chinesa”, pontua o diretor Antônio Carlos Braga. O curso completo exige cerca de três anos de estudos para a formação. Os alunos aprenderão sobre a sociedade chinesa, leitura de chinês básico, ortografia chinesa básica, básico de conversação e compreensão oral.
 
Além de promover o intercâmbio de culturas, o curso livre de mandarim tem entre as metas formar professores brasileiros do idioma chinês no Brasil e também ampliar horizontes e oportunidades de trabalho e negócios para brasileiros com a China, mas há ainda outras boas novidades envolvidas pela parceria firmada entre a Uepa e a Universidade de Shandong. “Começamos um intercâmbio científico. A nossa universidade tem vários cursos em temas de interesse dos acadêmicos chineses, como os estudos na área ambiental. Nossos professores também agora podem fazer pesquisas na China. Iniciamos um momento de grandes trocas”, avalia Braga. “Além disso, abre-se uma porta para se vivenciar a cultura da China e também para grandes oportunidades profissionais no país”.
 
Foi o que aconteceu para o estudante paraense Leoni de Souza Belato, 24. Aluno do curso de Engenharia Ambiental da Uepa, em julho de 2013 ele partiu para a cidade chinesa de Wuhan com a ajuda do programa Ciência Sem Fronteiras, do governo federal. A oportunidade de fazer disciplinas de sua área na China University of Geosciences, por meio de um programa sanduíche, foi o ponto de partida.
 
Leoni acabou passando dois anos na cidade chinesa de 16 milhões de habitantes – considerada de porte pequeno para os padrões populacionais da China. Isso porque, antes de ir ao curso da universidade de Geociências, teve que passar um ano estudando mandarim na Central China Normal University, também de Wuhan. “Foi uma experiência incrível e muito rica, porque você toma contato direto com a cultura todos os dias e acaba aprendendo rapidamente o idioma. Eu recomendo, mas lembro as dificuldades de comunicação de quando cheguei ao aeroporto com meus dois colegas do Rio Grande do Sul. É outro universo, com pessoas falando uma língua sem similares em nenhum lugar no mundo. Você se sente um analfabeto, um cachorro perdido. É uma grande diferença partir para a China com a oportunidade de antes se fazer um curso como esse agora aberto no Pará pelo Instituto Confúcio”, sorri.
 
Trabalho à vista
 
Em Wuhan, o aprendizado do mandarim, para além das lições na universidade, se tornou uma urgência movida às necessidades de contato de Leoni Belato com as ruas. Depois, se tornou progressivamente uma agradável experiência cultural. “Imagine que em uma cidade como Wuhan, situada no interior da China, quase ninguém sabe falar inglês. Foi um grande aprendizado no primeiro ano de contato, quando eu ainda morava no alojamento da universidade. Tanto que, no segundo ano, já cursando a China University of Geosciences, optei por alugar um apartamento. Aí meu mandarim deslanchou, pois você tem que se virar para pedir água, comer etc”.
 
Para Leoni Belato, o intercâmbio foi tão bom que mudou até planos profissionais futuros. Hoje ele pensa em voltar à China para fazer um mestrado de três anos dedicados apenas ao estudo do mandarim. Há grandes oportunidades para o paraense. Uma delas é uma possível carreira de professor de línguas, na própria universidade que o acolheu.
 
“É algo que eu recomendo muito para quem está à procura de oportunidades de carreira no exterior e até mesmo no Brasil. É o idioma de um país que está invadindo o mundo, como uma grande força econômica. Em São Paulo, recentemente vi uma grande feira aberta apenas para pequenas empresas chinesas que estão se instalando no Brasil. Eles estão procurando muito profissionais que dominem mandarim”, aposta Belato.
 
Estudante do segundo ano do curso de Secretariado Trilingue da Uepa, Heloísa Bezerra, 18 anos, está entre os alunos que farão parte das primeiras turmas de mandarim abertas pelo Instituto Confúcio no Pará. Apesar da pouca idade, a universitária enxerga muito bem as oportunidades que podem ser abertas pelo curso livre.
 
“Na minha área de atuação, que lida diretamente com empresas que podem estar situadas fora do País, é fundamental agregar mais essa experiência. No meu currículo já terei formação em inglês e espanhol. O mandarim é algo que se torna obrigatório pelo crescimento das possibilidades de comércio com a China, que têm impacto para empresas em todo o mundo”, pondera. Amante da cultura asiática, Heloísa comemora a nova oportunidade de estudos no Instituto Confúcio aberto no Pará. “Tenho grande vontade de sair do Brasil e firmar uma carreira no exterior”, planeja a estudante da Uepa.
 
Também aluna da Universidade, a caloura Amanda Barros, 19 anos, se inscreveu no curso, mas ficou na lista de espera, pois as vagas já haviam sido preenchidas. Contudo, na última sexta-feira (17), uma ligação telefônica mudou o rumo da história, devido à grande procura e à abertura da turma especial para alunos da Universidade. Era a oportunidade que Amanda desejava. “Escolhi fazer mandarim primeiro porque faço Secretariado Executivo Trilíngue e é mais um idioma. Depois por causa da parceria comercial, eu me interessei porque pode ser acrescentado no currículo. Além disso, eu gosto da cultura asiática e então uni os interesses pessoal e profissional. Espero conhecer mais sobre a cultura e ter uma noção melhor do país”, deseja Amanda.
 
Parcerias
 
Braço da Universidade de Shandong, o Instituto Confúcio está presente em mais de 110 países, onde vem formando núcleos de estudos voltados ao ensino do mandarim e à difusão da cultura chinesa, exatamente como no centro agora aberto no Pará. Criado em 2014, a partir de convênio firmado entre as universidades do Pará e da China, o Instituto Confúcio do Pará é o décimo a ser instalado no Brasil, após sete anos de presença no País - e é o primeiro a funcionar em toda a região amazônica. As aulas são ministradas por professores chineses, ligados à Universidade de Shandong. Em contrapartida, o espaço onde funciona a partir de agora o instituto foi construído pela Uepa, em dois anos de investimentos. As obras foram entregues em maio passado.
 
A vinda do Instituto Confúcio ao Pará é um dos resultados diretos da visita feita pelo governador Simão Jatene à China, em 2012, para fortalecer relações comerciais entre o Pará e a potência asiática. Ainda em 2013 a Uepa assinou acordo de cooperação com a Shandong Normal University (SDNU) com essa finalidade. A instalação do Instituto Confúcio no Pará foi confirmada em ato que em 2014 reuniu a presidente Dilma Rousseff e o presidente da China, Xi Jinping, no Palácio do Planalto, em Brasília (DF). Na ocasião, uma assinatura de termos garantiu a criação de novas unidades do instituto chinês no Brasil. No Pará, o Instituto funciona na sede da Editora da Uepa, no bairro do Umarizal, em Belém.
 
“A China é a segunda maior potência econômica do mundo, enquanto o Brasil é a quinta maior economia do globo, além de ser o mais importante país da América Latina. Isso resume o quanto é importante essa aproximação, que tem grandes repercussões para os negócios entre os dois países. E a disseminação do ensino do mandarim é parte importante desse processo, para comunicação comercial”, avalia o professor Hui Pang, o diretor chinês do Instituto Confúcio no Pará. “Hoje cerca de 25% da população do globo fala mandarim. São cerca de 1,5 bilhão de pessoas. E uma das nossas metas também é formar professores que possam ensinar português na China”.
 
Língua para os negócios
 
O mandarim é o nome dado a uma das variações da língua chinesa. O chinês, chamado de “mandarim padrão”, é a língua oral oficial da República Popular da China. É o padrão linguístico escolhido para o país, que soma vários dialetos marcantes em diversas regiões. O mandarim é falado pela maior parte do norte e do sudoeste chinês. Quando é considerado um idioma separado, possui mais falantes do que qualquer outra língua do planeta - e por isso mesmo já é uma das seis línguas oficiais adotadas pelos protocolos da Organização das Nações Unidas (ONU).
 
O idioma soma cerca de 885 milhões de falantes apenas entre os chineses, e é falado também em outros países e territórios como Taiwan, Hong Kong, Macau e Singapura. O mandarim tem 80 mil caracteres, os chamados “hanzis”. Desses, sete mil são os mais usados. A China é hoje o país mais populoso do planeta, com 1,3 bilhão de habitantes, e é a segunda potência econômica do mundo, atrás apenas dos EUA. Considerado atualmente uma forte influência para o mercado global, o país poderá tornar-se a maior potência econômica do mundo até 2030, estimam dados do Banco Mundial. Isso justifica uma crescente corrida pelo idioma como estratégia para garantia de boas parcerias comerciais em todo o mundo.
 
Curiosamente, já vem de longe a necessidade de estreitamento de laços entre os filhos da língua portuguesa e os que falam chinês, quando a esfera é a força dos negócios. Basta lembrar que o termo "mandarim" surgiu justamente das antigas relações de comércio entre portugueses e chineses, ainda no século XVII. No contato com portos de cidades chinesas, em busca de chá, seda e outros produtos, os portugueses só podiam tratar com altos funcionários do governo imperial da China. O contato de subordinados com forasteiros era proibido. Assim, as negociações comerciais eram feitas apenas com os chineses "que mandavam".
 
Desse modo, para os portugueses, o idioma usado por esses altos funcionários ficou conhecido como "mandarim" no ocidente. Foi a partir dos relatos portugueses que a língua passou a ser assimilada na Europa. Em inglês, o primeiro registro de uso da palavra "mandarim" é de 1589.
 
Serviço:
O Instituto Confúcio do Pará está instalado no prédio sede da Editora da Uepa (Eduepa), na Travessa Dom Pedro I, número 519, entre Municipalidade e Senador Lemos, no Umarizal. Atendimento das 9h às 12h e pelo telefone (91) 3222-1320.
 
Texto: Lázaro Magalhães/Agência Pará
Fotos: Ize Sena e Rodolfo Oliveira/Agência Pará